CARTA DE SOBRAL PINTO A SUA IRMÃ NATALINA
Rio, 11 de janeiro de 1937.
Natalina, (…)
Que tem você, por exemplo que se envolver com o meu gesto de aceitação da defesa do Luiz Carlos Prestes? Longe de merecer eu censura dos corações bem formados, como o seu, deverei deles recolher aplausos e louvores. Nunca me afirmei homem TÃO NITIDAMENTE CRISTÃO como na hora em que declarei ao Conselho da Ordem dos Advogados no Distrito Federal que aceitaria o patrocínio da causa de Luiz Carlos Prestes.
Não há, minha cara irmã, ninguém que não tenha direito a uma palavra de amparo, de conforto, e de defesa, ante o Tribunal dos homens. Deus, que tudo sabe-se tudo pode, antes de proferir a sua sentença contra Caim, que acabava de derramar o sangue de seu irmão, quis ouvi-lo, como narra explicitamente a Sagrada Escritura, dando aos homens, com este seu exemplo, a indicação irremediável de que o direito da defesa é, entre todos, o mais sagrado e o mais inviolável.
Deixar, nestas condições, de patrocinar a causa de Luiz Carlos Prestes seria, Natalina, atentar contra a caridade cristã. Ninguém, que se honre com o magnífico nome de cristão tem o direito de não estender sua mão amiga a quem, como Luiz Carlos Prestes, se vê insultado, injuriado, e escorraçado do convívio dos seus semelhantes.
Depois, minha cara irmã, se você se mostra tão hostil a esse homem, cujo patrocínio, GRATUITO foi agora confiado à minha modesta capacidade, é porque os jornais estabeleceram em torno dos seus propósitos uma campanha de sistemática desmoralização.
Aí tem você, nestas palavras simples que o meu afeto ditou para o seu coração, os motivos que me levaram a aceitar a causa desse homem, cuja alma foi também resgatada pelo sangue generoso de Jesus Cristo.
Inquieta, e cheia de solicitude pelo meu futuro, você pergunta agoniada:
“E as consequências deste seu gesto?” Não me interessam, Natalina.
Você sabe que só uma coisa me preocupa neste mundo: o cumprimento dos meus deveres.
Aceitando esta causa ingrata julgo, de boa fé, que estou me submetendo aos deveres da minha profissão. Assim como quem não tem coragem de renunciar aos prazeres não deve de se fazer sacerdote, do mesmo modo como, quem tem medo da morte não pode se fazer militar, assim também quem não dispõe de coragem cívica, e de energia moral não deve de ingressar nos quadros da advocacia.
Abraçando-a e a todos daí, receba o meu beijo amigo fraternal.
Sobral Pinto